Arquivo Pessoal
Entre sonhos desconexos, acordo com um barulho no quarto ao lado. O ambiente já não está tão escuro…percebo uma claridade tímida passando por baixo da porta do banheiro. Imagino que a manhã se aproxima tão preguiçosa quanto eu.
Ouço passos se aproximando. Pisadelas abafadas por uma meia de lã. Theo chega tateando ao pé da minha cama e sobe até o travesseiro engatinhando, para logo se aninhar sob as cobertas onde deveria estar seu pai, que está viajando. Deita a cabecinha no travesseiro, aproxima-se de mim sob as cobertas e fica ali encaixadinho, sem permitir nem uma frestinha entre nós dois. Encosta o rosto no meu, bochecha com bochecha. Sinto sua pele macia e seu cheirinho de menino. Esse, pra mim, é o cheirinho do paraíso.
E, quando penso que o cenário já é perfeito o suficiente, ele abraça minha cabeça e pousa sua mãozinha do outro lado do meu rosto. E acaricia de levinho. E ficamos ali, um curtindo a presença e o calor do outro, no silêncio da manhã que se inicia e dos nossos pensamentos.
E, nesse momento, eu penso que não há forma melhor de começar um dia. E também penso em todas as mães que acabaram de receber o diagnóstico de autismo para um filho. E, dentre elas, as que me escrevem com duas perguntas que lhes tiram o sono: existe autista carinhoso? Meu filho vai, algum dia, dizer “eu te amo, mamãe”?
E a resposta para ambas está ali, aninhada comigo, respirando junto, me aquecendo, acariciando meu rosto. Se isso não é uma declaração de amor, então, eu preciso reaprender vários conceitos.
Porque, pra mim, está muito claro: as melhores declarações de amor que eu já recebi, na vida, vieram desse garotinho. Mudas, silenciosas. Mas profundas, intensas, e totalmente verdadeiras.
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