Já vivemos várias fases desde que o autismo veio à tona na nossa vida. Assim que foi diagnosticado, Theo entrou em uma maratona: escola de manhã e, todo dia, alguma terapia à tarde. O revezamento inicial era entre ABA e fono. Alguns meses mais tarde, entrou no rodízio, também, a terapia ocupacional.
O que percebemos é que o desenvolvimento dele deu um salto no início, principalmente no primeiro ano: passou a perceber mais o mundo em volta e começou a entender e responder a comandos verbais. A fala parecia estar tendo algum progresso. Achávamos que estávamos no caminho certo.
Entre os 3 e 4 anos, Theo teve uma regressão. O resto da pouca fala que tinha sumiu e o sensorial complicou de vez. O comportamento repetitivo e os interesses restritos pioraram bastante nessa época. Comentei sobre isso neste post AQUI.
Após um tempo vendo que ele não estava melhorando com as mesmas terapias, resolvemos repensar tudo. Entramos com um ABA mais lúdico, algo meio misturado ao Floortime, com uma profissional maravilhosa em casa (a tia Pê!). Paramos com a fono porque vimos que, de fato, não estava ajudando. E começamos a Integração Sensorial e a natação pra tentar melhorar a parte física, que sentimos que estava impactando diretamente todo o resto. E aí tinha um bônus: todos esses momentos eram extremamente lúdicos pra ele. Ele se divertia. Ele gostava. Meu menininho parecia mais feliz do que estava antes!
No meio desse processo, parei de trabalhar de vez e passei a acompanhá-lo mais de perto nas intervenções.
E era neste esquema que estávamos quando nos mudamos de São Paulo para Londres.
Já na terra da rainha, Theo ficou quase 3 meses sem escola. O que me salvou nesse período foi uma terapeuta que ia em casa e fazia um RDI/ABA com ele. Isso ajudou pra que ele não ficasse sem nada de estimulação “profissional”. Quando, finalmente, entrou na escola, era por mais tempo do que ele estava acostumado no Brasil: das 8:15 às 15:00 (ao invés de só meio período). E, lá, tinha acompanhamento de uma fono, musicoterapia e equoterapia. Na sala, também investiram pesado no uso de PECs e ele se desenvolveu bastante no uso dessa ferramenta.
Chegando aqui em Estocolmo, Theo entrou em uma escola em que faz ABA pela manhã, tem suporte de PECs e, à tarde, continua em um esquema que eles chamam de “fritids” (quase um “tempo livre”, onde passeiam, vão a parques, museus, andam de trem, conhecem lugares). O horário aqui é das 8 às 15:45.
E foi aqui que eu decidi que é isso. Menos é mais. E acabou.
Eu poderia ter conseguido terapias pra ele após a escola. Poderia. Mas não quis.
Sabe o que me fez repensar??
Theo fez TUDO isso de intervenção desde os 2 anos de idade, teve essa agenda de executivo de multinacional…e continua autista severo e não verbal.
Conheço mais de um caso de crianças pequenas que fizeram qualquer terapia por apenas 50 minutos 3 vezes por semana e praticamente “perderam o diagnóstico”. Tem uma coisa chamada “neurologia de cada criança” que permanece um mistério.
Se não falar até os 5 anos não fala mais? Mentira. De verdade. Leia aqui.
Hoje, recebi uma foto dele aos 2 aninhos no Timehop, fiquei olhando para aquelas bochechas de bebê e pensando “quem te vê nessa foto não imagina quantos compromissos você tinha nessa idade”.
Quando recebemos o diagnóstico, recebemos, também, quase uma ampulheta que grita “olha o tempo passando! Intervenção precoce!! Quanto mais e antes melhor! Precisa falar antes dos 5 anos!!!”. É uma tortura lenta. É desesperadora essa corrida contra o tempo que nos enfiam no bolso junto com o papel escrito F84.
E, se é assim pra gente, imagino pra eles, que sentem tudo em excesso. Acredito que ele sentia a pressão. E, em alguns momentos, quis gritar, sair correndo, dizer que aquilo tudo o estava massacrando. Mas éramos pais aflitos, confiávamos na palavra dos profissionais que nos atenderam e acreditávamos estar fazendo o melhor. Sempre por amor. Mas o amor não é infalível.
Criança precisa de tempo para ser criança. As terapias são importantes, mas devemos sempre, SEMPRE nos questionar se não está demais. E é com o tempo que desenvolvemos essa sensibilidade. Não tem jeito.
Hoje, percebo que o Theo, realmente, aprende em um ritmo mais lento. Devagar e sempre. Se o colocarmos em 40 horas de terapia semanais ou 8 horas, provavelmente o resultado vai ser o mesmo. Com a diferença de que, com as 40 horas, ele vai estar muito mais cansado e estressado.
Não estou contando isso tudo para te dizer que aí, na sua casa, acontece o mesmo. Estou apenas ligando o alerta para que você preste atenção aos sinais que o seu filho dá.
Como se não bastasse tudo isso, o diagnóstico também coloca nos ombros das mães (principalmente) o peso de um Maracanã:
“O tempo
Olha o tempo
Está passando!
CADA MINUTO É UMA OPORTUNIDADE DE APRENDIZADO
Cada interação sua com ele tem que ensinar algo
A mãe é essencial para ensinar, ensinar, ensinar o autista”
Criança precisa de tempo pra ser criança. Pra brincar mesmo sem saber brincar. Pra fazer flap de mãos, ver a poeira contra a luz. Pra não fazer…nada!
Mãe precisa ser mãe. Mãe precisa dar colo, aconchego, fazer cócegas, brincar sem compromisso, arrancar risadas. Precisa passar remédio no dodói. Fazer cafuné na hora do sono. Precisa guiar, chamar a atenção, educar.
Nem toda mãe tem talento pra terapeuta. Mas será que precisa ter?
Não dou respostas porque não as tenho. Mas convido às mesmas reflexões que tenho feito por aqui. Que saibamos direcionar bem o amor, as expectativas, e gerenciar bem o tempo que nossos filhos passam conosco, com eles mesmos e com o mundo.
Foto inicial: Shutterstock
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