Eu tinha 5 anos e meio quando fiz minha primeira grande mudança. Morávamos em Divinópolis, uma cidade do interior de Minas Gerais, e fomos para Governador Valadares porque meu pai foi transferido no trabalho.
Já li em algum lugar que uma criança pode não se lembrar de um evento, mas lembrará de como ele a fez sentir…e é exatamente isso. Lembro muito bem do sentimento principal: medo. Do desconhecido, da nova cidade, da nova escola, dos novos amiguinhos. Lembro de ouvir minha mãe falando que iria pra qualquer lugar, mas não gostaria de ir pra Governador Valadares. Se a minha mãe não queria ir, por que eu iria querer?
Tenho as fotos que fiz na escolinha, no dia em que fui me despedir. Saí em todas elas com uma cara de bunda inacreditável. Fim do mundo. Parecia que alguém tinha morrido. Lembro de chorar quando saímos definitivamente da casa em que morávamos, de onde tenho lembranças muito gostosas.
Hoje, perguntei à minha mãe: o que eu falava pra ela? Como eu parecia me sentir naquela época? A resposta foi “você parecia sentir um misto de excitação pelo novo com medo de perder o que já tinha”.
Bom…e por que eu estou contando isso tudo? Porque estou usando essa situação para me colocar nos sapatos do meu filho. Ele está passando por algo muito parecido na mesma idade: 5 aninhos. Só que com algumas diferenças bem importantes:
1. Eu, aos 5 anos, podia chegar chorando para a minha mãe e dizer “eu não quero me mudar, não quero sair da escolinha”. Ela me acolheria, explicaria que teríamos que ir, mas que a cidade nova era cheia de escolas legais, amigos novos e coisas excitantes pra fazer. Eu me acalmaria.
2. Eu, aos 5 anos, podia explicar para a minha mãe como eu estava me sentindo. Podia dizer que estava triste. E ela me explicaria toda a situação e me confortaria.
Consigo imaginar exatamente o que está se passando com ele quando lembro da situação pela qual passei na mesma idade, mas com muito mais recursos para lidar com isso. E, mesmo assim, foi difícil. Theozinho é autista e tem grandes dificuldades de comunicação. Ainda não fala. Além disso, tem extrema dificuldade em lidar com as emoções, principalmente as desagradáveis. E, desde que começamos a falar da iminente mudança perto dele e com ele, ele tem demonstrado vários comportamentos difíceis.
Bilhetes chegam da escola falando que ele está “choroso” sem motivo aparente. Também tem se mostrado muito mais intolerante nas terapias. Está claramente mais agitado e ansioso. Nesta semana, mandei este desabafo na fanpage do Facebook:

Um desabafo e 300 comentários!
Eu nunca esperava tantas respostas…quanta gente solidária! Mais de 300 comentários! 😀
O que foi muito bom: várias pessoas sugeriram que eu usasse as “histórias sociais” com ele. Como tem sido muito proveitoso, queria compartilhar com vocês.
“As social stories (histórias sociais) foram desenvolvidas para dar suporte aos indivíduos com autismo para que eles lidem melhor com situações sociais.” ˜ Ali and Frederickson (2006, p. 355)
Uma história social pode ser um guia escrito, de preferência usando muitas imagens, descrevendo situações sociais, comportamentos esperados, habilidades ou conceitos. Ela também é ótima para ajudar o autista a entender a perspectiva de outras pessoas.
Basicamente, como sabemos que, em geral, autistas são muito visuais, uma das melhores formas de explicar situações complexas pra eles é essa.
Há vários aplicativos de social stories pra se usar no tablet se seu filho prefere esse formato. Você insere as figuras, escreve as legendas e grava a locução. Achei o Social Stories (gratuito, da TouchAutism.com para a App Store) muito didático e fácil de usar. Mesmo assim, preferi usar o bom e velho powerpoint e ir lendo eu mesma as legendas pro Theo.
Ao me colocar nos sapatos dele (e conversando com algumas pessoas), descobri que há 2 situações incomodando bastante o nosso garotinho: a mudança iminente e a saída da Bibi, a babá tão querida dele (falei dela nesse post AQUI).
Então, fiz duas histórias sociais: uma falando de cada caso em particular. Tentei ser o mais rápida possível, porque sei que o tempo de atenção dele é curto.

A história social da Bibi…

…e a da mudança
A primeira vez que mostrei as duas pra ele, ele se comportou super bem com a primeira. Até chegou a se aproximar da tela do computador quando apareceu o avião, arregalando os olhos todo interessado. Também deu risada quando viu a foto do Pato. Mas…quando mostrei a da Bibi, ele saiu correndo e chorando. Partiu meu coração…mas, agora, eu sei o que está incomodando mais o menininho. 🙁 De qualquer forma, tem sido uma ajuda muito legal. Certeza que ele já está entendendo melhor as situações e implicações!
E há outros usos extremamente úteis das histórias sociais: explicar o que se espera de comportamento em locais como restaurantes e cinemas, explicar o que é aceitável ou não na sala de aula, o passo a passo do corte de cabelo ou do exame de sangue, e até que tipo de roupa se usa em cada época do ano, por exemplo.

Imagem: http://bit.ly/208KalD
No Pinterest há vários exemplos de histórias sociais. Você vai ver uma gama de ocasiões para usá-las.
E aí? Mãos à obra?? 🙂
Comments