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A lei, o autista e a escola

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No guest post de hoje, a advogada Lúcia Benito – que mergulhou no assunto devido à necessidade do próprio filho – responde às principais questões dos pais de crianças autistas ou com outras deficiências sobre escola, acompanhante especializado e legislação vigente. Aproveitem e, caso tenham mais dúvidas, deixem nos comentários! 🙂

Perguntas mais frequentes sobre a lei

Meu filho tem transtorno do espectro autista. Ele é considerado pessoa com deficiência?

Sim. Ele é considerado uma pessoa com deficiência e possui direitos e obrigações previstos na Convenção Internacional sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência e legislações relacionadas às pessoas com deficiência. Pessoas com deficiência são aquelas que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas” (§ 2º, do art.1º da Lei nº 12.764/2012). Qual o papel da família em relação à educação do aluno com autismo?

A família tem um papel importantíssimo no sucesso da educação do aluno com autismo. Ela deve cooperar e envolver-se com o processo de educação, devendo opinar e participar ativamente das decisões realizadas em relação ao aluno.

Qualquer escola é obrigada a aceitar meu filho?

Sim. As escolas devem acolher todas as crianças, independentemente de suas condições sociais, físicas, intelectuais, emocionais, etc. Ela deve assegurar condições de acesso, aprendizagem e participação de todos os estudantes, em um espaço que reconheça e valoriza as diferenças de cada um.

Qual adaptação a escola regular pode oferecer para o meu filho?

Dependendo da necessidade apresentada, a escola pode disponibilizar prova diferenciada, professor assistente, materiais didáticos adaptados, outros métodos de avaliação, material alternativo de comunicação, cadeira escolar especial, entre outros.

Meu filho frequenta uma escola comum e não consegue acompanhar as atividades em sala de aula. A escola deve disponibilizar um profissional para ajudá-lo?

Sim. Nos casos em que houver comprovada necessidade de apoio às atividades de comunicação ou interação social, a escola deverá disponibilizar acompanhante especializado no contexto escolar, atuando em parceria com o professor e demais atividades escolares. (Lei n.12.764 de 2012, em seu artigo 3?, parágrafo único, descreve os direitos da pessoa com transtorno do espectro autista).

Meu sobrinho não tem independência para as atividades da vida diária, como alimentação ou cuidados com a higiene. A escola deve fornecer um acompanhante?

Sim. Se o aluno apresentar comprovada necessidade de apoio na locomoção, alimentação ou cuidados pessoais, a escola deverá disponibilizar acompanhante especializado (cuidador) durante o período de aula.

Como faço para conseguir este profissional (acompanhante especializado)?

Se a própria escola não requisitar o profissional, o primeiro passo é entrar em contato com a Secretaria Municipal ou Estadual de Educação (dependendo da escola) e apresentar um requerimento escrito do pedido de acompanhante especializado. Importante anexar relatórios dos médicos e dos profissionais de saúde que acompanham o aluno, justificando a necessidade do profissional especializado. Guarde a cópia do requerimento com o protocolo (com data e assinatura do funcionário que recebeu).

Entreguei o requerimento de solicitação de acompanhante especializado, mas a Secretaria de Educação não respondeu e meu filho não consegue frequentar a escola sozinho. O que devo fazer?

Neste caso é possível recorrer ao Ministério Público Estadual. Informações (endereço e telefone) podem ser obtidas no site do Conselho Nacional do Ministério Público AQUI. Outra possibilidade é acionar o Judiciário, através da Defensoria Pública do Estado (caso não tenha condições financeiras de pagar pelos serviços jurídicos) ou advogado particular.

Meu filho esta matriculado na escola particular e necessita de uma mediadora (acompanhante especializado). A escola pode cobrar alguma taxa extra por isso? E pelo profissional que ficará com meu filho, devo pagar?

Não. A escola particular é submetida às normas gerais da Educação Nacional, ou seja, devem efetivar a matrícula do aluno com autismo no ensino regular e garantir o atendimento às necessidades educacionais específicas. Assim, não pode repassar as despesas decorrentes da educação especial à família do estudante ou qualquer inserção de cláusula contratual que exima a instituição, em qualquer nível de ensino (Nota Técnica 24/2013 do Ministério da Educação). Sobre esta questão, o Estatuto da Pessoa com Deficiência estabeleceu que as instituições privadas são proibidas de cobrar valores adicionais de qualquer natureza em suas mensalidades, anuidades e matrículas. E ainda, criminalizou tal conduta, com previsão de crime punível com reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos e multa. Obs: Importante observar que o Estatuto entrará em vigor em janeiro de 2016.

E se a escola particular cobrar por algum serviço extra, o que devo fazer?

Procure a diretoria da escola e apresente por escrito à ilegalidade da cobrança, requerendo a desconsideração da mesma. Importante protocolar o pedido e guardar cópia da solicitação. Caso a escola ignore o pedido, o próximo passo é recorrer à Diretoria Regional de Ensino ou na Secretaria Municipal (ou Estadual) de Educação, apresentando todas as provas. Também é possível recorrer ao Ministério Público Estadual, Defensoria Pública do Estado (caso não tenha condições financeiras de pagar pelos serviços jurídicos) ou advogado particular.

A recusa da matrícula do aluno com autismo é crime?

Sim. A recusa e o não atendimento às necessidades do aluno com autismo fere dispositivo constitucional que assegura o direito à inclusão escolar, e também, o artigo 8º, I da Lei n. 7.853/89.

O que fazer se houver recusa na matrícula do aluno com deficiência?

– No âmbito administrativo: Recomenda-se que os responsáveis documentem tudo, como o pedido de matrícula e a recusa motivada. Após, apresentar a denúncia na Diretoria Regional de Ensino ou na Secretaria Municipal (ou Estadual) de Educação. Após a denúncia, haverá um procedimento para a apuração dos fatos, com possibilidade de adequação da conduta ou descredenciamento da instituição de ensino, bem como aplicação das penalidades previstas no art. 7º da Lei nº 12.764 ao gestor escolar ou autoridade competente que recusou a matrícula. Importante ressaltar que a multa prevista é de 3 (três) a 20 (vinte) salários-mínimos. No caso de reincidência, apurada por processo administrativo, haverá a perda do cargo.

– No âmbito jurídico: Os responsáveis devem registrar o fato ocorrido na Delegacia de Polícia, através do Boletim de Ocorrência (com base no artigo 8º da Lei 7.853/89). Comunicar o Ministério Público Estadual, ou ainda, procurar a Defensoria Pública ou um advogado particular para ingressar com as medidas cabíveis.

Meu filho foi desligado repentinamente da escola regular sem justa causa. O que fazer?

O desligamento arbitrário configura infração tipificada como crime pelo artigo 8º da Lei 7.853/89, da mesma forma que a recusa da matrícula. Assim, deve ser adotado o mesmo procedimento descrito acima.

Meu neto tem deficiência e na escola sofre discriminação pelos amigos e funcionários. Como devo proceder?

Inicialmente, procure a diretoria da escola e explique detalhadamente o que está acontecendo com o aluno. Solicite imediata intervenção da direção para a tomada das medidas cabíveis. Dependendo da gravidade da situação, este tipo de comportamento pode ser enquadrado como injúria qualificada (artigo 140, parágrafo 3º do Código Penal), com reclusão de um a três anos e multa. Caso não resolva, vá até à Delegacia de Polícia e registre o ocorrido através do Boletim de Ocorrência.

Meu filho não se adaptou na escola da regular de ensino. Ele ficou mais agressivo, chora quando está na escola e não quer ficar lá. Tentei colocá-lo na escola especializada (especial), mas não tem vaga. O que devo fazer?

O aluno com autismo dever ser matriculado, de preferência, na rede regular de ensino. Na prática, sabemos que nem todos os alunos são beneficiados pelo sistema inclusivo proposto nas escolas comuns. Assim, cada caso deve ser analisado pela equipe pedagógica, juntamente com a equipe médica e profissionais de saúde que acompanham o aluno, respeitando o desenvolvimento e as necessidades apresentadas. As escolas especializadas prestam um atendimento mais direcionado às necessidades educativas ou sociais do aluno, quando não conseguem se integrar nas classes comuns do ensino regular. No caso de não haver vaga em escola especializada (especial), reúna relatórios da escola e dos médicos/profissionais de saúde que acompanham o aluno, demonstrando a necessidade do atendimento especializado. Recorrer ao Ministério Público Estadual. Informações (endereço e telefone) podem ser obtidas no site do Conselho Nacional do Ministério Público AQUI. Outra possibilidade é acionar o Judiciário, através da Defensoria Pública do Estado (caso não tenha condições financeiras de pagar pelos serviços jurídicos) ou advogado particular. Lei 7.853/89: “Os órgãos e as entidades da Administração Pública Federal direta e indireta responsáveis pela educação devem dispensar tratamento prioritário e adequado aos assuntos relacionados à Política Nacional para a Integração da Pessoa com Deficiência, viabilizando a matrícula compulsória em cursos regulares de estabelecimentos públicos e particulares de pessoa portadora de deficiência capazes de integrar na rede regular de ensino, bem como a inclusão, no sistema educacional, da educação especial como modalidade de educação escolar, com a inserção, das escolas ou instituições especializadas públicas e privadas. (…)

Meu filho está matriculado no ensino especial e querem transferi-lo para a escola da rede regular de ensino. Como deve ser feita esta avaliação?

Dependendo do desenvolvimento apresentado pelo aluno, a equipe pedagógica do ensino especial e a família devem decidir conjuntamente quanto à transferência do aluno para escola da rede regular de ensino, com base em avaliação pedagógica e indicação de escola que tenha condição adequada de realizar o atendimento educacional sugerido.

ESCOLAS PARTICULARES NÃO PODEM COBRAR A MAIS E NEM RECUSAR MATRÍCULA DE ALUNOS COM DEFICIÊNCIA!

O Supremo Tribunal Federal (STF) julgou improcedente  a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5357 ajuizada pela Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino (Confenen).

Conforme voto do  relator e ministro Edson Fachin, “as instituições privadas de ensino exercem atividade econômica e devem se adaptar para acolher as pessoas com deficiência, prestando serviços educacionais que não enfoquem a questão da deficiência limitada à perspectiva médica, mas também ambiental, com a criação de espaços e recursos adequados à superação de barreiras”.

Desta forma, fica declarada a constitucionalidade das normas da Lei Brasileira de Inclusão (Lei 13.146/2015)  que estabelecem  a obrigatoriedade das escolas privadas em promoverem a inserção de pessoas com deficiência no ensino regular e  a proibição de qualquer  cobrança ou  valor adicional nas mensalidades, anuidades e matrículas.

Lúcia Benito é advogada e mantém o blog Defesa Especial.

Seu email de contato é lucia@benito.adv.br

Imagem: Shutterstock

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