Ultimamente, tenho falado bastante do PECs (sistema de comunicação por troca de figuras). Mas é porque eu realmente o considero uma excelente ferramenta e ainda não consigo entender seu pouco uso no Brasil.
Como já citei antes, todas as escolas que eu visitei em Londres e Estocolmo usam PECs. Se a criança foi diagnosticada com autismo (ou qualquer outra condição neurológica) e é não verbal, a fono faz uma avaliação para entender se ela vai se dar melhor com linguagem de sinais ou PECs. Via de regra, o PECs é a melhor opção, pois não exige tanta habilidade motora. Ao contrário do mito difundido no Brasil, no exterior, sabe-se que o PECs não atrasa a fala (e muito antes pelo contrário!).
Quando decidimos nos mudar pra Londres, eu já comecei a fazer um “PECs adaptado” com o Theo em casa. Em um powerpoint, organizei fotos das coisas que ele gostava de comer com os nomes em baixo (já em inglês pra ele ir acostumando). Imprimi, plastifiquei e colei aquele ímã adesivo atrás. Foi tudo pra geladeira! Ensinei a ele que, para pedir algo, deveria pegar a figura na porta da geladeira e me entregar.
Nosso primeiro esquema de comunicação por figuras
E como funciona o PECs de verdade? São 6 fases:
A criança aprende a importância da comunicação como uma via de mão dupla: dá a figura e ganha o que quer (objeto ou alimento, por exemplo). O aprendizado inicial é feito com uma só figura de algo que a criança goste muito.
Ainda com uma figura, o aprendizado sai da mesa – ou da proximidade – e a criança aprende a “viajar” com o PECs de uma ponta a outra da sala para entregar à pessoa e ganhar o que quer.
É nesta fase que a criança aprende a discriminar entre figuras. Com o uso de um mínimo de 2 figuras, já na pasta com velcro, ela aprende a pegar a figura do que realmente quer ganhar.
A criança aprende a construir a primeira frase usando figuras: um ícone do “eu quero” mais a figura de interesse. Depois, ela aprende a expandir as sentenças usando adjetivos, verbos e preposições (“eu quero a bola azul” por exemplo).
A criança aprende a usar o PECs para responder à pergunta “o que você quer?”.
A criança aprende a comentar respondendo a perguntas como “o que você vê?”, “o que é isso?” e “o que você ouve”, por exemplo. Ela pode compor sentenças com “eu vejo” e “eu sinto”, por exemplo.
Theo está na fase 4. Ainda não usa adjetivos, mas compõe frases simples com o “eu quero” mais a figura.
Neste vídeo aqui eu mostro como estruturei a pastinha de PECs dele:
Como eu já falei antes, mais importante que a criança falar, é se comunicar. E o PECs deu a primeira voz ao Theo. Mais tarde, podemos passar pra algo mais sofisticado. Mas tem sido uma experiência única entender como funciona a cabecinha dele e como ele é inteligente!
Um exemplo foi um dia desses em que, logo de manhã cedo em um sábado, ele me entregou a ficha com “eu quero” e mais a figura de “dormir”. Achei estranho, porque tínhamos acordado há uma hora e ele, com certeza, não tinha mais sono. Ele foi me puxando pela mão e, quando chegamos ao quarto, percebi que ele queria, na verdade, brincar na cama e nas cobertas. Como não tinha PECs pra isso, ele usou o de dormir porque imaginou que eu entenderia que ele queria ir para a cama. 🙂
Alguns PECs, ele aprendeu sozinho só de ver na pasta: a figura do “tomar banho”, por exemplo, e a figura do “comer”, que ele nunca usa no meio do dia (quando, geralmente, pede coisas específicas como “biscoito” ou “pipoca”). O PECs de “comer”, ele começou a usar sozinho quando já sabia que a hora do jantar estava próxima.
A pastinha do Theo
E aqui vai a resposta a outra dúvida frequente: usar fotos ou pictogramas? Tudo depende da capacidade de generalização do seu filho. Se ele ainda é muito novo, pode ser melhor começar com fotos e ir substituindo aos poucos. Eu uso uma mistura dos dois, porque ainda não há pictogramas bons para todas as situações (como “cócegas”, por exemplo). Mas há um software gratuito de pictogramas chamado Picto Selector que você pode baixar e usar.
Seu filho já fala algumas palavras? Ou tem alguma fala, mas é ecolálica ou pouco funcional? O PECs ajuda a organizar isso. Ele não é útil só para crianças totalmente não verbais.
Minha sugestão é que você monte os PECs em um powerpoint, imprima, plastifique, e compre uma pastinha e um rolo de velcro. Existem plastificadoras baratinhas no mercado e você pode fazer tudo em casa mesmo!
Aqui tem um vídeo em inglês com a demonstração das 3 primeiras fases do PECs. Você pode clicar no “CC” para ver as legendas traduzidas:
Há mais vídeos no youtube sobre todas as fases. A maioria em inglês, mas dá sempre pra entender o contexto e usar as legendas.
Eu aprendi a aplicar o PECs porque fui treinada pela fono do Theo em Londres. Você pode negociar com a fono do seu filho um treinamento básico.
O treinamento completo, no Brasil, é dado pelo pessoal da Pyramid: http://www.pecs-brazil.com/
E aí? Mãos à obra? 🙂
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